22 de janeiro de 2025

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Comunicação em crise e o jogo que o governo ainda não aprendeu – 21/01/2025 – Wilson Gomes

Na ilustração colorida, uma toupeira marrom escura, com o focinho e unhas rosadas, emerge de um buraco na terra, deixando ver claramente metade do corpo para fora.  O escuro buraco, tem o formato da silhueta de Lula vestindo o chapéu de ponta cabeça.  O céu azul chapado dá destaque a toupeira que veste óculos de armação amarela, com lentes para miopia.

Na semana passada, assistimos a mais uma batalha pela opinião pública entre governo e oposição: a disputa pela percepção da norma da Receita sobre a fiscalização das operações com Pix. E, novamente, o governo saiu derrotado de forma esmagadora, em uma disputa que envolveu declarações oficiais, cobertura jornalística, as redes de distribuição de informação da extrema direita e vídeos de figuras políticas influentes.

O resultado, segundo a pesquisa Quaest, foi impressionante: 87% ouviram que o governo iria cobrar imposto sobre o Pix, e 67% acreditaram nisso —mesmo após desmentidos oficiais amplamente respaldados pela imprensa. Um massacre, desses raramente vistos em disputas entre forças de peso semelhante.

Não me lembro da última vez que um governo tenha recorrido a uma Medida Provisória para debelar uma impressão pública que não conseguiu modificar. Ou tenha voltado atrás em uma medida acerca da qual não considera que tenha errado. Mas aconteceu. É uma MP em que se jura que não vai se fazer algo que nunca se disse que faria. Não haverá incidência de tributos sobre transações com Pix, não se tocará no sigilo ou na privacidade das informações financeiras, não se cobrará a mais em pagamentos via Pix.

O que a massa entendeu foi basicamente um “errei, fui moleque, mas se você voltar para mim, esquece, vou ser o cara que o seu amor merece”. Tem cabimento?

O governo pode alegar ter sido pego no contrapé durante a transição da sua comunicação. Contudo, a norma que gerou a confusão é de setembro, e o burburinho só ganhou força em janeiro.

Se o governo não detectou a formação da onda de ataques e o crescimento da incerteza dos cidadãos mais pobres com o que parecia uma maldade da administração Lula, é porque não havia ninguém acompanhando a conversa social e a opinião pública. E se não foi capaz de reagir a tempo e debelar os focos de boatos antes que ficassem fora de controle, é porque nunca teve um protocolo para comunicação de crise.

Aliás, esse parece um conceito desconhecido pelo governo. Caso contrário, teria tido respostas para quando a desinformação correu solta acerca das doações para os afetados pelas enchentes no Sul e agora na guerrilha informacional sobre a fiscalização do Pix, vendida como taxação. Nos dois casos, sobrou uma população desesperada por saber o que de fato estava acontecendo, enquanto faltaram respostas, estratégias de comunicação projetadas para isso, uma oferta regular, qualificada e confiável de informação.

Crises chegam sempre sem anunciar; por isso, organizações as preveem, antecipam e se preparam para ter respostas quando elas irrompem. E não existe vácuo de informações durante crises. Se falha o lado que deveria oferecer dados críveis, alguém se aproveitará da incerteza das pessoas para fornecer os boatos e prover as interpretações convenientes. E isso é do jogo.

E olha que, nesse caso, na ausência de uma comunicação governamental eficiente, o jornalismo de referência apostou em peso na própria capacidade de esclarecer a população. A benevolência do jornalismo chegou a tal ponto que a oposição e a extrema direita não tiveram dificuldade em vender em suas redes a ideia de que as redações eram a verdadeira Secom. Nada funcionou.

Nem toda a cavalaria da elite do jornalismo brasileiro, que veio em socorro do governo, parece capaz de conter os efeitos de redes alternativas e horizontais de comunicação digital quando elas convergem, ou de um vídeo mambembe, parcial e partidário de alguma figura influente dos extremos do espectro político.

Foi curioso observar como governo e jornalismo, diante da própria impotência nos novos cenários de disputa pela opinião pública, recorreram tão rapidamente à tática defensiva de “acusar os acusadores”. Nesse caso, trilharam o caminho mais refutável: desqualificar toda crítica como fake news.

Em seguida, atribuíram o sucesso dos detratores da medida não à habilidade destes em captar e explorar as angústias e incertezas da população diante de uma intervenção mal planejada e mal explicada, mas à suposta operação de algoritmos superpoderosos, manobrados em conluio com “big techs” malignas. Daí foi um passo curto para jurar que o episódio comprova a urgência de se “regular as redes” e para sugerir que criticar medidas do governo deveria, de alguma forma, ser tratado como crime.

Sim, o jogo político hoje é pesado e passa pela guerrilha da informação. A questão que permanece é: quando, afinal, o governo entrará em campo devidamente preparado para a peleja?



Fonte ==> Folha SP

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