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Uso de IA prejudica médicos a detectar sinais de câncer – 12/08/2025 – Equilíbrio e Saúde

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A IA (inteligência artificial) tem ajudado médicos em diagnósticos e aumentado a taxa de detecção de lesões relacionadas ao câncer e outras doenças, independentemente da experiência do profissional. Mas um estudo publicado na revista The Lancet Gastroenterology & Hepatology nesta terça-feira (12) sugere que a dependência excessiva da automação pode deixar os médicos menos atentos e menos precisos quando atuam sem o recurso tecnológico.

Os resultados mostram que, após a introdução da IA para auxílio de diagnósticos em colonoscopias, a taxa de detecção de adenomas (TDA), lesões precursosas do câncer colorretal, caiu de 28,4% para 22,4% em exames feitos sem o auxílio de IA.

O estudo foi realizado em quatro centros de colonoscopia na Polônia entre 8 setembro de 2021 e 9 março de 2022. O uso de IA foi introduzido nos centros no final de 2021.

Durante esse período, 734 colonoscopias foram realizadas com auxílio de IA e 1.443 sem. Dessas últimas, 795 foram feitas antes e 648 após a implementação da IA nos centros pesquisados.

Os exames foram realizados por 19 endoscopistas experientes que haviam conduzido mais de 2.000 colonoscopias previamente cada e tempo médio de experiência de 27,6 anos.

“Até onde sabemos, este é o primeiro estudo a sugerir um impacto negativo do uso regular de IA na capacidade dos profissionais de saúde de completar uma tarefa relevante para o paciente em qualquer área da medicina”, afirma Marcin Romańczyk, da Universidade de Ciência, Arte e Medicina, na Polônia, envolvido no estudo.

“Nossos resultados são preocupantes, dado que a adoção da IA na medicina está se espalhando rapidamente. Precisamos descobrir quais fatores podem causar ou contribuir para problemas quando profissionais de saúde e sistemas de IA não trabalham bem juntos, e desenvolver maneiras de corrigir ou melhorar essas interações.”

A colonoscopia permite a detecção e remoção de lesões pré-cancerosas (adenomas), levando à prevenção do câncer colorretal. A TDA, proporção de colonoscopias nas quais um ou mais adenomas são detectados, é um indicador diretamente relacionado à qualidade e eficácia dos exames na prevenção do câncer.

Segundo o artigo, uma TDA mais alta está associada a um maior efeito de prevenção do câncer. Além disso, manter uma TDA alta é considerado um objetivo importante tanto para endoscopistas, quanto para os sistemas de saúde e pesquisadores.

Dos 1.443 exames sem auxílio IA, 177 (12,3%) foram encaminhados devido a sintomas de alarme, como perda de peso, anemia e sangramento gastrointestinal, outros 230 (15,9%) eram colonoscopias de vigilância, 32 (2,2%) foram positivos para teste de sangue oculto nas fezes, 467 (32,4%) tinham outras indicações, como mudança no hábito intestinal ou diarreia, e 537 (37,2%) estavam com indicações desconhecidas.

Nesses casos, houve uma queda significativa na taxa de detecção de adenomas. Antes da implementação da IA nos centros, foram identificados adenomas em 226 de 795 (28,4%) colonoscopias. Após a introdução da tecnologia, esse número caiu para 145 detecções em 648 (22,4%) exames realizados.

O estudo destaca que, no período em que a IA começou a ser usada, houve uma proporção maior de pacientes do sexo masculino e um uso maior de sedação, dois fatores associados a um aumento na TDA. Mesmo assim, a taxa diminuiu após a introdução da IA, o que torna a queda observada ainda mais relevante.

Gustavo Zaniboni, fundador da empresa de consultoria em inteligência artificial Redcore, explica que sistemas de IA para auxiliar em diagnósticos médicos, especialmente por imagens, já são utilizados há bastante tempo.

Segundo o especialista, esses sistemas funcionam principalmente como indicativos do local onde se deve olhar, e não como substitutos do diagnóstico completo.

“Um modelo desse tipo não vai dizer ‘aqui tem um câncer’. Ele mostra onde tem mais chance de ter algo suspeito para que o profissional olhe com atenção,” disse Zaniboni.

O que ocorre com o uso prolongado desses sistema, segundo ele, não é o esquecimento da habilidade, mas uma perda gradual dela em decorrência da falta de prática.

“Se você tem uma rotina que te dá habilidade, se você deixa de praticar, você perde essa habilidade. Então a IA não destreina o humano a identificar o problema. Ela destreina o humano a encontrar aonde olhar para identificar o problema.”

Zaniboni alerta para o risco da perda da capacidade humana devido à dependência da IA, semelhante ao que ocorre com pilotos de avião que usam piloto automático na maioria dos voos e têm menos prática no modo manual. A prática constante é necessária para manter as habilidades. Se não for exercitada, a habilidade se perde com o tempo.

Os autores afirmam que existem algumas limitações no estudo. Como se trata de uma pesquisa observacional, a comparação entre os grupos pode ter sido influenciada por diferenças clínicas não controladas, apesar das tentativas para diminuir esse viés. Além disso, foi utilizado apenas um sistema específico de IA, o que dificulta a generalização dos resultados para outras tecnologias similares.

Outro ponto relevante é que o estudo incluiu somente endoscopistas experientes, deixando em aberto o impacto da IA em profissionais em formação. Também houve variabilidade no número de exames realizados por cada médico, o que pode ter interferido na análise individual.

“Precisamos urgentemente de mais pesquisas sobre o impacto da IA nas habilidades dos profissionais de saúde em diferentes campos médicos”, diz Romańczyk.

Pesquisadores da Uesb (Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia) publicaram um artigo na revista Bioética que traz um panorama sobre estudos realizados nos últimos cinco anos na intersecção IA, bioética e saúde.

O trabalho identificou riscos do uso de IA na prática médica, como a redução do pensamento crítico do profissional ao usar a tecnologia passivamente, bem como o distanciamento que a ferramenta pode trazer para a relação profissional-paciente e questionamentos sobre quem será responsabilizado se a IA causar efeitos negativos ao paciente.

O estudo ressalta a preocupação com o chamado “paternalismo de máquina”, quando decisões automatizadas sobrepõem-se à autonomia e ao julgamento de médicos e pacientes.

Embora a IA possa servir de apoio, os autores afirmam que ela não substitui a relação humana, a empatia e a análise crítica insubstituíveis no cuidado em saúde.



Fonte ==> Uol

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